2025/03/04

Camões em Agostinho da Silva

 

Agostinho da Silva
Imagem Associação Agostinho da Silva, no Facebook.



"Naquela Ilha dos Amores
que sonhou Camões outrora
só entra e fica liberto
quem lá viva desde agora"

Agostinho da Silva
In: Quadras inéditas, p.72.


"Se o ideal último do Português é reconquistar o Paraíso
e entrar naquele despojar-se de espaço e tempo 
a que Luís de Camões preludiou com a Ilha dos Amores, 
serão dispensáveis as guerras 
e terão sido os melhores militares os que têm visto a sua missão 
como sendo essencialmente a de manutenção da Paz, 
para que o mundo se vá construindo, 
não os que são tentados pelas aventuras 
ou pelos lucros das guerras."

Agostinho da Silva
In: Educação de Portugal, 1970.



“E o que é a Ilha dos Amores? 
É o Império do Espírito Santo entre os homens. 
É não perder nenhuma das características de ser homem 
e ganhar todas as que se atribuem a Deus. 

Porque os homens ali, como se vê pelo seu comportamento com as ninfas, 
são plenamente homens, comem e bebem no banquete, 
mas depois estão fora do Tempo, e fora do Espaço, como está Deus. 

Fora do Tempo, de toda a História, de toda a Eternidade; 
e fora do Espaço, que a máquina do mundo está lá mas como o Espaço, 
todo ondulante, sai todo da máquina do mundo, 
os cavalheiros estão fora da máquina do mundo. 
São homens e divinos ao mesmo tempo. 

Camões acha que o ideal do Português é chegar a um estado em que 
aquilo que se mantém hoje separado, ou é até contraditório, 
[aparece como] uma parte, a outra parte do mesmo universo. 
É o lado luminoso e o lado oculto da Lua 
conforme a posição em que cada um estiver a olhar para a Lua, 
ou tiver imaginação para imaginar que coisa será o luar do lado onde não há luar” 

Agostinho da Silva
in Ir à Índia sem abandonar Portugal: 
Considerações: Outros Textos, 1994, p. 48.
 [Entrevista de 1987].


"Provavelmente ainda levará muito tempo para isso, 
mas tenho esperança, tenho esperança de 
que se estabeleça na Terra um paraíso terreal
de que, pela meditação, os homens cheguem a 
um tempo em que o paraíso terreal e o espiritual, o do Céu, 
sejam exactamente a mesma coisa 
- a tal história de que já falámos da Ilha dos Amores de Camões, 
em que o homem deixa que brote de si tudo quanto é de possibilidade divina 
ao mesmo tempo que não perde nada da sua humanidade, 
o que significaria, no fim de contas, um regresso de Adão e Eva ao Paraíso"

Agostinho da Silva 
(com Henryk Siewierski)
In: Vida conversável,
Zéfiro, 2020, p.186.


"[...] nós podemos dizer que todo o culto do Espírito Santo era uma peça de teatro: 
primeiro acto, a coroação do imperador; 
segundo acto, o banquete gratuito; 
terceiro acto, abrir a porta da cadeia. 

E que era realmente uma peça através da qual a pessoa tinha que entender 
que o importante dentro dela era nunca dar cabo 
do imprevisível, do espontâneo, do poético e do criador dentro da pessoa, 
e que era para isso que a coisa vinha e existia. 

É que o Camões depois já põe aquilo como um caminho para a vida. 
Que coisa é preciso fazer para chegar à Ilha dos Amores? 
Pois, é preciso navegar com muito saber, com muita disciplina 
e, ao mesmo tempo, com muita curiosidade pelo que se vai descobrir, 
muito amor pela novidade, 
muito cuidado perante o que sucede, muito gosto de aventura, claro, 
e muito bom humor."

Agostinho da Silva 
(com Henryk Siewierski)
In: Vida conversável,
Zéfiro, 2020, p. 224.




"Como intitularia então eu o poema de Camões […] ? 
Pois Viagem do Nada que nós somos, por Tudo sermos, 
ao Tudo que são todos sendo Nada
Um pouco comprido, valha a verdade, 
e talvez um seu tanto confuso; 
afinal bem fez ele chamando-o apenas de 
Os Lusíadas, isto é de Os Portugueses; 

que aqui onde escrevo estes apontamentos 
para futuros e verdadeiros historiadores, 
pois nada mais sou do que amador de casos, 
ou no Brasil ou na África, sempre Portugueses ou Lusíadas somos: 
é a Língua nossa raiz e nossa fronde, nossas flores e nossos frutos, vida nossa e nossa morte,
cumprindo-nos fincar um pé num dos lados do mundo, outro no mais distante 
— se é que lados tem —, ao universo medindo e limitando 
com este nosso passo sem limite"

Agostinho da Silva
"De como os portugueses retomaram a Ilha dos Amores [1982], 
in Dispersos, p.736-738.




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As citações constam em:





Redação: 3.03.2025