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O grande Camões - um épico, um herói, um santo, depoimento de Guerra Junqueiro



Guerra Junqueiro (1850-1923)






Camões é o génio lusitano, a idealidade da raça num herói. Pertence ao grupo dos imortais, dos que viveram no mundo o breve instante, com olhos de eternidade e de infinito.
A vida resolve-se em dor e amor, e ele amou e sofreu como poucos homens. Amou a justiça, amou a virtude, amou a beleza. Amou a pátria na humanidade, a humanidade no universo, e o universo em Deus. E desse imenso amor fez colheita de luto e colheita de dor. Semeou beijos e nasceram-lhe víboras. Pôs na fronte da Pátria um diadema de estrelas, e recebeu em galardão uma coroa de cardos. A inveja, o rancor, a estupidez, a mentira, a hipocrisia, a ferocidade, – bando de lobos e de hienas, vão atrás dele continuamente. Não o deixam, rasgam-no, dilaceram-no. Toda a sua existência de herói e de mártir é a escalada abrupta de um calvário. O sangue do coração evaporou-se-lhe em génio e verteu-se-lhe em lágrimas. Foi Apolo na cruz, aedo e Messias, bardo e Redentor. Cantou como um épico, lidou como um herói e acabou como um santo.

Guerra Junqueiro

Em: “A festa de Camões” – ‘Discurso pronunciado a 10 de junho [de 1912] em Zurique, num banquete da colónia portuguesa’, in Prosas dispersas. Porto: Livraria Chardron, 1921, p. 95-96.

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